sexta-feira, 13 de abril de 2012

Para onde foram os vaga-lumes?

Por Carolina Godoi



É tanta luz maior nessa cidade, que já não podemos ver aquele pisca-pisca surpreendente dos vaga-lumes. A "pequena luz" ou lucciola, como os italianos os chamam, não está aí tão disponível em nossas noites de verão.
Eles ainda existem esvoaçando em algum lugar?
Foi-se o tempo em que eu acompanhava meu irmão a caçá-los e capturá-los para si, na casa de minha infância. Ele gostava de possuí-los e usá-los como um giz luminoso para suas criações, que geralmente eram feitas em si mesmo. Espremia os pequenos pirilampos na curta camisa branca e saía a voar como um. Por alguns minutos capturava a luz, mas para isso os exterminava. Eu amava vê-los no céu escuro, mas ao mesmo tempo me fascinava com o que meu irmão fazia, espetáculo brilhante e perturbador. No minuto em que a luz deles se apagava, sofria pelos dois.
Ainda me pergunto se gostava mais da surpresa de vê-los ou da sensação da procura interminável que empreendia no escuro da noite. Seus voos são incertos, a união de iguais em miniatura se configurava em desenhos de seres bizarros, mas nunca pensei neles com medo. É para se temer um fogo dentro de algum ser? Sabia que eram fugidios e de certa forma livres, pois em metade do tempo não podiam ser vistos e quando eram vistos, no momento seguinte se disfarçavam em outro lugar. Tinham asas, imagine, não bastava o privilégio dos raios luminosos.
Invejávamos os vaga-lumes porque eles se encontravam e se entrelaçavam numa dança desconhecida e inalcançável entre os arbustos de mil árvores da enorme casa de meus pais. Hoje sei que esses lampejos de machos e fêmeas são para chamarem uns aos outros para copular, mas não sabia que aquela luz tinha algum propósito. Ela simplesmente existia por existir e não ter a resposta era o que me envolvia por completo.
Nesses poucos minutos em que meu irmão retia a micro luz dos vaga-lumes em riscos ampliados, tínhamos em nossos corpos a infância total e sempre alegre, com nossos risos e gritos de alegria e de terror pelo extermínio de tais criaturinhas. Eles existiam aos montes, não era de se recriminar a morte; compensavam os olhos brilhantes do caçula.
Afirmo categoricamente: Apesar de não vê-los, ofuscados por tanta luz, eles ainda existem na distância. Estão pela noite, ainda inocentes como nossas lembranças do passado e uma busca de desejo de um futuro. É preciso não deixar de procurá-los.

Texto inspirado pelo seminário de João Rocha baseado no livro "Sobrevivência dos Vaga-lumes" de Georges Didi-Huberman

Um comentário:

Fernando Lutterbach disse...

Vc é minha escritora favorita.
(além de ser a mais bela, claro).