quinta-feira, 4 de junho de 2009

Ode ao novo velho


Meu computador envelheceu mesmo sendo ainda tão novinho. Estava cansado, lento, irritadiço e abarrotado de arquivos velhos acumulados. Precisava de uma faxina geral; algo como apagar toda a existência pregressa e começar a instalar item por item. Para isso tive que escolher o que realmente importava para ficar dentro dele, e assim deixá-lo mais leve e eficiente. Jovem, resumindo.
Os programas foram todos atualizados com versões ultramodernas. Algo que me incomoda à princípio, pois eu já estava bem com as anteriores e não queria mudar. É que os programas mais novos sempre me pareceram piores pois perdem detalhes aos quais eu já estava apegada, tal qual criança com seu ursinho de pelúcia. Além disso, ganham possibilidades que eu nem sabia que precisava, muito menos queria!
A máquina ficou "tinindo de boa" e nosso trabalho está caminhando e fluindo como se estivéssemos numa pista cheia de óleo. O PC adorou se ver livre do que não precisava e pesava seus ombros (leia-se memória).
Meu computador rejuvenesceu.
Passei por esse processo ao seu lado na mesma semana em que uma grande amiga e aprendiz de cabeleireira descobriu meia dúzia de cabelos brancos escondidos em minha cabeça; no mesmo mês em que completo 10 anos de formada; no mesmo dia em que meu filho me chamou de "mãe" ao invés de "mamãe" pela primeira vez. Ouvindo meu grito de reclamação ele disse saindo com sua pasta e mochila para a escola: "Eu já cresci, mãe!"
Passo por isso melancolicamente, mas estampando um sorriso doce no rosto. Envelheci, pronto. No sentido mais belo que a palavra pode alcançar. Construí, conquistei, fiz, aconteci. Hoje posso com efeito ser, posso me desprender dos medos e aceitar o que sou, o que realmente gosto e o que não gosto. Posso dizer abertamente o que me incomoda, posso jogar uma roupa velha no lixo, posso não fazer aquilo que todo mundo está fazendo só porque é o que é esperado, posso não ir ao cinema porque gosto da TV, na minha casa. Posso reclamar e ser atendida sem sentir culpa. Posso desagradar, posso errar, posso refazer, posso ter outra chance. E posso continuar errando.
Ao repaginar meu computador o técnico só errou em uma coisa. Apagou todos os meus "favoritos". Vou ter que reinventá-los. Começar de novo e aprender a partir do zero o que realmente gosto agora, aos 32 anos, 4 meses e 3 dias.

Foto Fernando Grilo

3 comentários:

Rodrigo Vianna disse...

Olha Carolina,
No Yoga treinamos o desapego - principalmente, a ilusória noção de um eu que ganha, perde ou envelhece...
Mas devo confessar: às vezes, por mais que eu treine, me vejo mais apegado do que nunca. Afinal, sentir saudades, de vez em quando, é bom demais da conta!!!
Um grande abraço!

Fernando Lutterbach disse...

Para mim você não envelheceu, talvez tenha amadurecido e refinado os gostos e prioridades. Não é só seu corpo que continua jovem (e como!), sua cabeça anda a mil por hora, cheia de planos e vontades como sempre foi. A diferença é que os objetivos mudaram, assim como a vida. Beijos.

Ana F disse...

Emocionante, Carol. E, olhe, mesmo que a gente não queira, ou não perceba, mesmo que nenhum "técnico" os apague, nossos "favoritos" vão mudando continuamente. Mas não é uma renovação, antes uma depuração... Ainda bem que não somos renováveis como os computadores.